O Retrato de Dorian Gray

O Retrato de Dorian Gray é uma obra em que Oscar Wilde confronta o leitor com a perfeição impossível, as convenções dispensáveis ou a mortalidade inevitável. Wilde visualiza a cisão entre a aparência e a realidade objetivada na pintura.

A pintura revela ou exterioriza o que o homem esconde: sua decadência, sua consciência, sua idade, sua corrupção moral e psicológica que o levará à destruição do próximo e, finalmente, de si mesmo.

"... A beleza é uma forma de génio... diria mesmo que é mais sublime que o génio por não precisar de qualquer explicação. É um dos grandes factos do mundo, como a luz do sol, ou a primavera, ou o reflexo nas escuras águas dessa concha de prata a que chamamos lua. É inquestionável..."

Dorian Gray, um jovem narcisista, amante das artes e entregue aos prazeres humanos quer transformar sua vida em arte, a experiência de vida como experiência estética e, ao tentar exilar-se de sua culpa, esconde-se na superfície pintada, porém não consegue libertar sua mente da consciência.

É a história de corrupção moral por meio de esteticismo. Neste romance Wilde desafia a teoria de que o caráter de uma pessoa pode ser determinada por aquilo que está no exterior.

O Retrato de Dorian Gray — no original em inglês: The Picture of Dorian Gray — é um romance publicado por Oscar Wilde, considerado um dos grandes escritores Irlandeses do século XIX. Foi publicado inicialmente como a história principal da Lippincott's Monthly Magazine em 20 de junho de 1890 e, mais tarde, Wilde reviu, alterou e ampliou essa edição, que foi publicada em abril 1891 por Ward, Lock e Company.

O cenário é Londres, na Inglaterra aristocrática e hedonista do século XIX. Basil Hallward é um pintor que vê em Dorian Gray — um jovem de 18 anos pertencente à alta burguesia inglesa e dono de uma beleza física inimaginável, porém inocente — a inspiração que o impulsiona na busca da perfeição para que pinte o quadro de uma forma tão transcendente que todos ficam estupefatos com a exatidão da pintura, parecendo mesmo que Basil conseguiu captar a própria alma de Dorian.

Lord Henry Wotton, um aristocrata cínico e hedonista típico da época e grande amigo de Basil, conhece Dorian e o seduz para sua visão de mundo, onde o único propósito que vale a pena ser perseguido é o da beleza e do prazer:
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"o senhor dispõe só de alguns anos para viver deveras, perfeitamente, plenamente. Quando a mocidade passar, a sua beleza ir-se-á com ela; então o senhor descobrirá que já não o aguardam triunfos, ou que só lhe restam as vitórias medíocres que a recordação do passado tornará mais amargas que destroçadas".
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Ao ouvir estas palavras, Dorian Gray observa a obra pronta e, constata tristemente, que aquele retrato manterá aquela beleza juvenil para sempre ao passo que ele envelhecerá e, neste momento, expressa o desejo de ser eternamente jovem,nem que para isso tenha que dar sua alma!

.“ Que tristeza ! Eu envelhecerei, ficarei horrível.... Mas esse quadro sempre se manterá jovem. Nunca será mais velho do que esse dia de Junho … Se fosse o contrário ! Se fosse eu que me mantivesse jovem e o retrato ficasse velho! Por isso, — por isso — Eu daria tudo ! Sim, não há nada no mundo todo que eu não daria por isso”.

Isto nos remete às influências do ideal grego de beleza, principalmente a beleza masculina, visto no Mito de Narciso que se apaixona por sua imagem refletida nas águas, e, morre. Também em Fausto, de Goethe, o homem faz um pacto com o diabo, vendendo sua alma em troca de prazeres e juventude eterna e, Dorian, por sua vez daria até sua alma pela juventude eterna e, muito embora, o diabo não tenha aparecido para assinar o contrato, seu desejo foi igualmente atendido.

Essa obsessão com o belo — beleza especial de superfície — e do prazer está em desacordo com um puritanismo teimoso moral predominante na época vitoriana, que insiste que a moral é o que realmente faz o homem e, os pecados de uma pessoa se inscreve na tela da consciência.

Lord Henry, homem extremamente inteligente, perspicaz, irônico, cativante e com grande vivência nos relacionamentos humanos — , capaz de exercer forte influência sobre as demais pessoas — sente-se desafiado pela beleza e aparente inocência do jovem Dorian, aproxima-se deste e passa a instigá-lo e a estudá-lo em suas reações e atitudes, fazendo com que Gray tome consciência de sua beleza e do valor de sua juventude, iniciando-o assim num mundo de vícios e desregramento.

Dorian segue a vida na companhia de Henry, influenciado por suas palavras, seduz, destrói vidas, torna-se egoísta, devasso e mau, muito embora, seu rosto permaneça com os traços angelicais dos seus 18 anos e, por sua vez, Henry delicia-se com a transformação no caráter do jovem.

Dorian conhece a jovem atriz Sibyl Vane de 17 anos e se apaixona por sua beleza e por suas interpretações de heroínas de Shakespeare num pequeno teatro. Ele resolve casar-se com Sibyl e convida Basil e Lorde Wotton para assistirem a uma das suas apresentações. Nessa noite toda a energia vital de Sibyl que antes estava tão somente dirigida à arte de representar, agora estava dirigida apenas para o objeto amado – Dorian — e, uma vez que seu amor se torna real, Sibyl perde sua capacidade de atuar, e Dorian a despreza cruelmente.

Desesperada a jovem atriz envenena-se e morre causando a primeira mudança no caráter do moço a qual se faz sentir imediatamente no retrato. Seu sorriso não era mais o mesmo. Caracterizava-se pelo cinismo e maldade. O fim trágico dessa história de amor e outros acontecimentos levam a uma drástica mudança na personalidade, até então em formação, desse personagem.

E é nesse contexto que ele percebe a alteração em seu quadro e que fantasticamente, o desejo feito em um momento de fúria realizou-se! E aí inicia -se a gradual destruição da figura no quadro, a figura representativa da alma de Dorian Gray, que a cada dia que passa se perde ainda mais no abismo da maldade. A partir daí esconde o quadro num quarto desocupado, onde ninguém além dele poderia vê-lo.

Dorian é apresentado a escritos hedonistas, onde a busca do prazer deve ser o objetivo primordial e único de todos os homens; onde as causas, os modos e as formas não têm nenhuma importância, perante o objetivo principal; onde os pecados são esquecidos apenas quando outros ainda maiores são cometidos.

Tudo isto é notório quando uma pergunta é feita a Dorian: Qual o proveito de um homem que ganha o mundo inteiro, mas perde sua própria alma? E é isso o que vemos ocorrer com ele. O bem e o mal são sempre discutidos e interpretações distintas são sempre atribuídas a eles.

Wilde, enquanto escritor, foi um grande questionador e crítico da sociedade e do período em que viveu, e nesta obra, utiliza Lorde Henry para ser seu porta voz.

No desenrolar do romance podemos evidenciar que Dorian não consegue determinar a sua própria identidade, está constantemente debaixo de outras influências: Basílio, a pintura, Lord Henry, Sibyl Vane, o livro amarelo e, como resultado, ele não consegue formar uma identidade, integrada, madura.

Dorian vive uma vida de decadência, entregando-se aos prazeres sensuais, bons e ruins. O retrato representa o registro de transgressões e envelhecimento, enquanto sua própria aparência permanece jovem e bela. Dorian é fortemente influenciado por um livro dado a ele pelo Lord Henry, o qual descreve um personagem que se entrega a seus caprichos e fantasias em grau excessivo.

A partir de então, Dorian passou a viver tudo que lhe era ou não permitido. Passou a ter uma conduta fria e interesseira com todos à sua volta. Induziu pessoas a atos vulgares e criminosos, sempre impune. Assassinou seu amigo Basil, à facadas, quando este descobre o que está acontecendo. Leva outro amigo, um químico, ao suicídio após induzí-lo a desfazer-se do cadáver de Basil.

Dorian tenta exilar sua culpa, escondendo-se na superfície da tela pintada, mas nao consegue libertar sua mente da consciência. Assim, a pintura, influenciada pelo comportamento de Dorian, registra sua crueldade e, apenas o quadro se altera, transformando-se numa figura monstruosa, donde das mãos da imagem gotejava sangue.

Será que as mudanças no retrato ocorrem na superfície pintada ou na mente de Dorian?
Será que ele sofre de autoscopia? — uma condição clínica em que o sujeito vê uma imagem de espelho de si mesmo.
Poderia ser a percepção de Dorian da pintura, em vez de mudar a própria pintura?

Passado 25 anos, um irmão de Sibyl Vane retorna da Austrália, para onde havia partido em busca de emprego — como faziam os demais desprotegidos da sociedade inglesa. James Vane busca o sedutor da irmã para matá-lo, porém, morre em um acidente de caça da qual Dorian participava.

Dorian já contava com mais de 40 anos, quando pensou em curar sua alma. Pensou em levar uma vida pura, sem magoar quem quer que fosse. Ele se deu conta de que sua soberba o levou a esta vida de pecados. Amaldiçoou sua beleza e mocidade e pensou que sem elas sua vida seria pura. Porém, o que mais lhe doía era a morte, em vida, da sua alma.

Mais tarde, Dorian, que após ter resistido ao impulso de seduzir outra mulher, informou a Lord Henry que tinha decidido reformar sua vida. Mas, estaria Dorian fazendo uma boa ação porque realmente estava tentando ser bom ou seria apenas para enaltecer ainda mais seu ego?

Naquela noite, uma vez mais ele fica chocado ao ver o retrato com um olhar de cinismo e hipocrisia moral.

Apesar de suas boas ações, o quadro não se alterava para melhor como supunha, continuava a gotejar sangue...ainda mais vivo e mais horrendo. Neste momento, Dorian percebe claramente a verdade: por vaidade, ele tentava não magoar mais ninguém, e a hipocrisia pusera-lhe no rosto a máscara da bondade. A única prova de seu mau caráter, de sua consciência, era o quadro. Então, resolveu destruí-lo.

Pega a faca usada para matar anos atrás o autor da obra, Basil, e trespassa o retrato. Ouviu-se um grito. Os criados acudiram. E, quando conseguiram adentrar ao quarto, viram na parede o magnífico retrato, e, no chão, jazia o corpo de Dorian, com a faca cravada no peito, que só pôde ser identificado pelos anéis em seus dedos.

Na parede, um angelical rapaz de 18 anos, dono de uma beleza juvenil indescritível, espreita de sua moldura com um inocente sorriso!

O Retrato de Dorian Gray tornou-se um símbolo da juventude intelectual "decadente" da época e suas críticas chocaram a hipócrita sociedade vitoriana que viu nele um espelho dos seus defeitos, alheio àquelas que considerava serem as suas virtudes.

Romance gótico ou comédia de costumes que além de ter despertado grande polêmica em relação ao seu conteúdo homoerótico — o autor, Oscar Wilde era homossexual e foi preso por isso — Wilde, foi apontado como o pai do decadentismo na Inglaterra, coisa que ele sempre negou e, em seu julgamento, algumas partes deste livro foram usadas contra ele.

Hoje, o livro tem sido descrito como "um dos clássicos modernos da Literatura Ocidental". A BBC classificou a obra como 118º na sua lista de "Big Read" — uma lista com os 200 romances mais populares.

O Retrato de Dorian Gray — um jovem que se envaidece de si mesmo, que se torna amante de si mesmo e da arte abstrata e pura, e que em seu nome e das insanidades sociais, insensibiliza, diagnostica e se auto-desculpa, porém, no final, quando quer mudar de vida, não há redenção naquele jovem, já que o fez foi pelo fato novidade, pelo amor ao novo, pelo amor à arte de viver.

É uma profunda reflexão sobre valor da arte, sobre a produção artística, sobre o belo, sobre o narcisismo e sobre uma juventude que parece não ter envelhecido em nada mais de um século depois.

Poder-se-ia dizer que este livro é uma crítica à sociedade inglesa do século XVIII, com uma série de alegorias à decadência moral e espiritual dessa mesma sociedade, sempre tão sorridente e bonita, mas suja e podre por dentro.

O livro também imortaliza o maior medo da humanidade: o medo de envelhecer — o amadurecimento, não só do corpo, mas também da alma e questiona a beleza, a juventude, os valores morais e a sociedade.

“O que a arte realmente espelha é o espectador,
 não a vida” - Texto do prefácio.



Sobre o autor:
Nascido em Dublin no dia 16 de Outubro de 1854, Oscar Wilde teve uma educação esmerada, vindo a formar-se na famosa Universidade de Oxford cerca de 20 anos depois.

Reconhecido como um excepcional poeta e ensaísta, Wilde era também um homem que tinha consciência da sua inteligência e do fascínio que provocava no público, ao ponto de ter afirmado na alfândega, aquando da sua chegada a Nova Iorque, ”Nada tenho a declarar, excepto o meu génio”.

Levando uma vida relativamente calma, chegando mesmo entre 1887 e 1889 e dirigir uma revista feminina, foi precisamente nesse espaço de tempo que escreve os poucos contos que produziu e o seu único romance, justamente o Retrato de Dorian Gray, e é curioso porque é devido a esse seu único romance que a sua vida se irá alterar de uma forma trágica, levando-o mesmo á sua ruína.

Por altura de 1893, época onde Wilde estreia algumas peças de teatro, conhece Lord Alfred Douglas, que havia ficado fascinado com o romance de Wilde.

Dessa amizade nasce uma relação amorosa que levaria o pai de Alfred Douglas, o marquês de Queenberry, a condenar aquela relação, insultando Wilde e um processo que acabaria com a acusação e condenação de Oscar Wilde à prisão pelo crime de homossexualidade.

Aí ficou preso durante dois anos, altura em que escreve uma longa carta de amor a Lord Alfred, que viria a ser publicada em 1905 com o título de ”De Profundis”. Sendo libertado em 1897, viu-se completamente arruinado.

Abandonado pela família, com a reputação completamente destruída, viveu da caridade dos seus poucos amigos até falecer em 1900 em Paris, de meningite, num quarto de hotel, completamente só. Morria assim, um dos grandes génios da literatura que o mundo já teve.

O Retrato De Dorian Gray
Autor: Oscar Wilde
Editora: diversas
Assunto: literatura estrangeira - romances
Preço: De R$ 16,50 até R$ 40,00

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